A Questão do Ensino Religioso nas Escolas
Por Caramuru
Afonso Francisco*
Alguns setores da mídia têm,
ultimamente, voltado a debater a questão do ensino religioso nas escolas,
notadamente nas escolas públicas, questão que se põe na medida em que o Estado
brasileiro é laico, ou seja, não tem uma religião oficial, mas, também, em
virtude do recente acordo firmado com o Vaticano, que garante a ministração do
ensino religioso nas escolas públicas para os católicos romanos, algo que
também deve ser estendido às demais religiões, se for aprovado o Estatuto das
Religiões, que se encontra em tramitação no Senado Federal, depois de já ter
sido aprovado na Câmara dos Deputados.
Além do mais, em virtude de toda
a discussão a respeito da liberdade religioso na campanha presidencial de 2010, a questão também
volta à tona, até porque a Presidenta da República fez questão, seja em seu
discurso de vitória, seja em seu discurso de posse, em se comprometer com a
plena liberdade de culto e de crença em nosso país.
A Constituição da República é
claríssima ao incluir o ensino religioso nas escolas. O artigo 210, § 1º da
Constituição diz que “o ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá
disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental”.
Nota-se, portanto, que o
legislador constituinte manteve a tradição dos textos constitucionais
brasileiros, permitindo o ensino religioso, desde que facultativo, o que é uma
disposição que nada mais é que aplicação, a este tema, da índole democrática
imprimida ao Estado brasileiro com a “Constituição cidadã”.
A Lei das Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (lei 9.394/1996)
praticamente repetiu o texto constitucional, no seu artigo 33, apenas fixando
que as referidas aulas não seriam feitas às custas dos cofres públicos, se
dando tanto de forma confessional, a partir de orientadores religiosos
preparados e credenciados pelas próprias organizações religiosas, ou
interconfessional, dentro de um programa que fosse feito por conjuntos de
entidades religiosas.
A Lei 9.475/1997, porém, alterou
o artigo 33 e transformou o ensino religioso em “parte integrante da formação
básica do cidadão”, vedando quaisquer formas de “proselitismo” e assegurando
“respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil”, deixando aos sistemas de
ensino a fixação de procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino
religioso e normas de habilitação e admissão de professores.
Esta nova disposição, que afronta
a Constituição da República, inviabilizou o ensino religioso confessional, permitindo
uma indevida intromissão do Estado na elaboração dos conteúdos desta
disciplina, até porque passou a ter como objetivo “a formação básica do
cidadão”, pondo como freio “o respeito à diversidade cultural religiosa do
Brasil”.
Na verdade, a lei veio criar um
“ensino religioso civil”, impôs parâmetros e limites para a veiculação de
conteúdos, tudo sob o argumento de que, como os cofres públicos iriam arcar com
estes professores, poderia e deveria impor limites à ação destes mesmos professores,
a fim de manter a “laicidade” do Estado.
A referida lei foi uma importante
vitória do “laicismo”, que não se confunde com a “laicidade”. “…Laicidade,
corretamente entendida, significa que o Estado deve proteger amplamente a
liberdade religiosa tanto em sua dimensão pessoal como social, e não impor, por
meio de leis e decretos, nenhuma verdade especificamente religiosa ou
filosófica, mas elaborar as leis com base nas verdades morais naturais. O
fundamento do direito à liberdade religiosa se encontra na própria dignidade da
pessoa humana. Infelizmente, mesmo em países de profundas raízes cristãs, como
a Espanha, este laicismo radical e anticristão é notado com clareza. Um Estado
que tenta impedir a vivência religiosa do povo, especialmente o Cristianismo,
com uma ação hostil ao fenômeno religioso e a tentativa de encerrá-lo
unicamente na esfera privada (…)o laicismo que hoje vemos é o do Estado que
caminha para se tornar um Estado com religião oficial e não um Estado laico: um
Estado totalitário ateu, que quer eliminar Deus e a religião e que investe
fortemente contra a liberdade religiosa. Um Estado cujo deus é o
individualismo, o hedonismo, o prazer material e a “liberdade” para aprovar
tudo que desejar, sem restrições morais..…” (AQUINO, Felipe. Estado laico ou
laicista. Disponível em: http://blog.cancaonova.com/felipeaquino/2011/02/02/estado-laico-ou-laicista/
Acesso em 11 mar. 2011).
A educação é direito de todos e
dever do Estado e da família promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade (artigo 205 da Constituição da República). Portanto, a ação
educacional deve se dar de forma integrada entre Estado, família e a sociedade
civil, incluindo-se, aí, naturalmente, as organizações religiosas, que podem e
devem cooperar com o Estado, nos exatos termos do artigo 19, inciso I da Carta
Magna, que manda que haja “colaboração de interesse público” entre Estado e
organizações religiosas.
Ora, a educação busca, segundo o
mesmo artigo 205 da Constituição da República, o “pleno desenvolvimento da pessoa”,
o que inclui a dimensão espiritual da pessoa, dimensão esta que o Estado
brasileiro, por ser um Estado Democrático de Direito, que, inclusive, garante a
liberdade de culto e de crença, tem de considerar e reconhecer.
Deste modo, não se vê qualquer obstáculo
para que se tenha o ensino religioso nas escolas, ensino confessional,
sustentado e patrocinado pelas organizações religiosas, permitida a
possibilidade de interconfessionalidade, mediante iniciativa das mesmas
entidades religiosas.
O Estado não pode impedir que os
pais solicitem que as escolas disponibilizem horário e local para a ministração
de aulas de ensino religioso por parte de orientadores religiosos devidamente
credenciados e preparados pelas organizações religiosas, em matrícula facultativa
e no mesmo horário das demais aulas. É direito garantido constitucionalmente e
exercício legítimo da liberdade religiosa.
A educação religiosa não está
confinada ao espaço privado dos lares, nem tampouco às organizações religiosas,
pois é algo de notável interesse público e que contribui para “o pleno
desenvolvimento da pessoa”.
O Estado não é “dono” do espaço
da escola, pois a escola é um ambiente onde Estado, família e sociedade
cooperam entre si e colaboram para que haja “a formação básica do cidadão”,
formação esta que tem de ter, também, a dimensão religiosa.
O Estado brasileiro não é
antirreligioso. Esta concepção, como bem diz o grande jurista brasileiro, Ives
Gandra da Silva Martins, é “…uma visão deturpada do Estado Laico, que não é UM
ESTADO SEM DEUS, mas um Estado em que a liberdade de pensar é plena e não pode
reputar-se ameaçada pelo respeito às tradições do povo e do País…” (A ditadura
do laicismo. Revista Jus vigilantibus
. Disponível em: http://jusvi.com/colunas/42669 Acesso em 11mar. 2011).
Ao mesmo tempo em que o Estado
brasileiro não quer permitir que os pais optem para que seus filhos tenham um
ensinamento, na escola, de orientadores de sua confissão religiosa, quer impor
aos filhos uma educação sexual segundo seus pontos-de-vista. Não seria a
educação sexual uma matéria também da esfera privada?
Por que podem ser instaladas
máquinas de “camisinha” nas escolas e não se podem ensinar os valores
religiosos por orientadores devidamente credenciados, de forma opcional, de
pessoas de sua confissão religiosa?
Notamos, aqui, que, por detrás
deste “laicismo” está o que as Escrituras denominam de “mistério da injustiça”
(II Ts.2:7) ou “espírito do anticristo” (I Jo.4:3), que resiste a tudo quanto
diz respeito a Deus (II Ts.2:4): a atuação maligna para afastar o homem de Deus
cada vez mais.
A este movimento anticristão,
nós, como servos do Senhor, em que está o Espírito Santo (Jo.14:17), devemos
resistir, assim como o Espírito de Deus o faz (II Ts.2:6,7), resistência esta
que se dará mediante a sujeição a Deus (Tg.4:7) e ao legítimo exercício de
nossos direitos civis e políticos, garantidos pela nossa Constituição da
República, entre os quais o da liberdade religiosa e da garantia do ensino
religioso em nossas escolas.
* Evangelista da Igreja
Evangélica Assembleia de Deus – Ministério do Belém e colaborador do Portal
Escola Dominical.
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