Escrever, Argumentar, Seduzir

Por Beth Brait
Todos nós, mortais, temos a impressão de que os escritores nascem sabendo escrever bem: seus textos saltam prontos da imaginação privilegiada para as páginas impressas de um livro. Por mais que eles insistam em afirmar que escrever significa mais transpiração que inspiração, que o processo é um eterno “pisar em grilos”, exigindo rigorosa disciplina, ficamos com a sensação que isso tudo só vale para os que não nasceram com escritores. Pra poetas e prosadores natos, basta preencher as folhas em branco com palavras, frases, parágrafos que, magicamente, materializam-se em histórias, personagens, espaço, paisagens, mundos cativantes. Nada de releituras, emendas, troca de palavras, eliminação de excessos, inclusão de trechos, correção de deslizes.

Ledo engano. A atividade de escrita é um processo trabalhoso, exigindo dos seus empreendedores bem mais que talento. Independentemente de sua finalidade, escrever requer observação, conhecimento, vivência, pesquisa, planejamento, consciência das formas de circulação, muita paciência e, consequentemente, leituras e releituras, construção e reconstrução. Como os grandes escritores, podemos identificar parte dos esforços exigidos por essa atividade, surpreendendo alguns momentos em que eles demonstram a forte e ambígua relação que mantêm com seus textos, expondo a maneira como administravam os detalhes que envolvem a escrita e, também, após a publicação, o interesse pelas formas de recepção. Essas exposições entreabrem uma fresta para que os demais “escreventes” conheçam alguns percursos e percalços do escrever, do dar acabamento a um texto, das formas de vê-lo correr mundo.

Nota/Fonte
Beth Brait é livre-docente da PUC-SP e USP e escritora.
Revista Língua Portuguesa, Ano III, Nº 25, p. 34, 2007.

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