"Deus me Livre de Ser Feliz"

Por Francikley Vito

Ouvimos com frequência uma frase que, de tão repetida, temos a sensação de que é uma necessidade primária. A frase é: Eu quero ser feliz! Mas quando desejamos ser feliz, o que realmente queremos dizer? Para muitos, a felicidade consiste em adquirir bens materiais, ter um trabalho bem-remunerado ou ser reconhecido por seus talentos, possuir uma família harmoniosa e gozar de boa saúde, etc.. Se assim fosse, não haveria aqueles que apesar de não ter a maioria dessas coisas (leia-se dinheiro e fama) quando perguntadas se são felizes, respondem com um sonoro e retumbante sim. Qual o motivo de algumas pessoas conseguirem ser feliz sem ter praticamente nada, enquanto outros, mesmos tendo tudo, vivem a procura de uma felicidade que parece nunca chegar? O que é a tão desejada e não encontrada felicidade? É possível ser feliz?

Em um artigo publicado no carnaval (um tempo em que a maioria das pessoas se enxergam como estando vivendo o auge da felicidade possível), o filosofo Luiz Felipe Pondé deu a um dos seus artigos o curioso título de “Deus me Livre de Ser Feliz”; uma provocação criativa e mordaz àqueles que se entendiam felizes. Segundo ele, o tipo de euforia que eram experimentadas naqueles dias de festa, era tudo o que ele não queria como modelo de felicidade. As festas carnavalescas no Brasil são dias em que as pessoas tendem a extravasar suas emoções e desejos em nome da “liberdade” que dizem desfrutar. Essas emoções são vistas pelo filósofo, não como algo bom, mas como algo trabalhoso, penoso, ruim. Daí a ambiguidade no título do seu artigo.

O pensador cristão C. S. Lewis, em carta escrita ao seu irmão que era alcoólatra, escreve: “Começo a suspeitar que o mundo não se divide em pessoas felizes e pessoas infelizes, mas em pessoas que gostam da felicidade e nas que, por estranho que pareça, dela não gostam”. Ao lermos essa colocação, somos tentados a pensar, erradamente, que o problema esteja em buscar a felicidade em si, mas isso não é verdade; a dificuldade ocorre quando não sabemos, ou não nos importamos em saber, o que é a verdadeira felicidade, ou a felicidade segundo Deus, para usar um termo comum. São esclarecedoras as palavras do teólogo e pregador D. M. Lloyd-Jones sobre o conceito de felicidade. Diz ele que “o grande alvo que a humanidade busca é a felicidade. O mundo inteiro anela obter a felicidade, e quão trágico é observar como as pessoas a estão procurando. A vasta maioria, infelizmente, busca-a de tal modo que essa busca só produz o infortúnio. Qualquer coisa que, mediante a evasão das dificuldades, meramente torne as pessoas felizes por curto prazo, em última análise só tende por intensificar a miséria e os problemas que eles enfrentam. É aí que entra o caráter totalmente enganador do pecado – sempre oferecendo felicidade, mas sempre conduzindo à infelicidade e ao infortúnio e à condenação final.”[1]

Segundo o pregador, por causa do pecado as pessoas são enganadas com algo que parece felicidade; paliativos que, ao invés de ajudá-las, acabam por aumentar o seu estado de miséria e que no final acabará por levá-las para a condenação final, longe de Deus.

Quando nos voltamos para as Escrituras, principalmente os escritos do Antigo Testamento, a felicidade aparece vinculada com o temer do Senhor, com obedecer aos Seus mandamentos e com a busca constante de Deus e de Sua Palavra; e se formos um pouco mais adiante nos Escritos bíblicos, veremos que no Novo Testamento a ideia de felicidade tem a ver com ser pobre de espírito, ter necessidade de justiça, ser pacificador, ser perseguido e coisas deste tipo (Mt 5). Se isso for o que um cristão pode chamar de verdadeira felicidade, ou de felicidade no sentido bíblico, será que teríamos coragem de pedir a Deus para sermos felizes, ou diríamos como o filósofo “Deus me livre de ser feliz”? Em que categoria de pessoas estaríamos inseridos, daquelas que gostam da felicidade ou daquelas que dela não gostam? A busca da felicidade é um fato; encontrar a verdadeira felicidade uma escolha que depende de nós.

Nota: [1]D. M. Lloyd-Jones. Estudos no Sermão do Monte. São José dos Campos: Fiel, 1999.

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