A Meditação na Vida Cristã 1/4

Por Caramuru A. Francisco

Texto áureo

“Antes tem o seu prazer na lei do Senhor e na Sua lei medita de dia e de noite.” (Sl.1:2)

I – A MEDITAÇÃO NA BÍBLIA SAGRADA

A questão da meditação deve ser bem analisada, visto que, por meio dela, a Nova Era tem conseguido se imiscuir na vida espiritual de muitos. Na verdade, a meditação, entre os cristãos, máxime entre os evangélicos, não é assunto muito abordado, já que a se trata de prática que encontrou guarida seja entre os cristãos do Oriente, seja entre os católicos romanos, sendo, mesmo, a base dos chamados “místicos”, em sua grande maioria, pessoas que se dedicaram à vida monástica, ou seja, à vida em mosteiros e conventos, prática que foi descartada pelos que seguiram a Reforma Protestante.

No entanto, a partir do século XIX, com uma nova busca da espiritualidade, após o desencanto com o racionalismo iniciado a partir do século XV no Ocidente, busca esta, inclusive, que deu origem ao movimento pentecostal entre os evangélicos, a meditação, como prática devocional, voltou a encontrar guarida na vida cristã, como também a ser difundida pela Nova Era, com o resgate das crenças orientais, notadamente o hinduísmo e suas variações e o budismo.

O resultado disto é que a questão da meditação voltou à tona, e como a Bíblia Sagrada fala dela, torna-se necessário verificar qual é o seu lugar na vida espiritual do cristão e um estudo sobre a doutrina bíblica da oração se apresenta como ocasião propícia para falarmos deste assunto, até porque o silêncio a respeito do tema entre os estudiosos da Palavra tem reforçado a influência deletéria que o movimento Nova Era, arauto do Anticristo, tem promovido entre muitos que cristãos se dizem ser.

“Meditar” é, precisamente, dizem-nos os lexicógrafos (aqueles que escrevem dicionários), o ato de “refletir, pensar longamente, ocupar-se, estudar, praticar e fazer”. A palavra hebraica empregada para “meditar” é “hagah” (הגה), cujo significado é “refletir, gemer, resmungar, ponderar, planejar, maquinar”. “…Hagah representa algo tranquilo, diferente do sentido de ‘meditação’ enquanto exercício mental. No pensamento hebraico, meditar nas Escrituras é repeti-las calmamente em som suave e baixo, abandonando interiormente as distrações exteriores.…” (BÍBLIA DE ESTUDO PLENITUDE. Palavra-chave: medita. Sl.1:2, p.537).

A palavra “meditar” é, em princípio, utilizada, pelas Escrituras, para indicar a leitura devocional da Bíblia, como se vê, por exemplo, em Js.1:8, onde o próprio Senhor, ao orientar Josué, após a morte de Moisés, manda que o novo líder de Israel meditasse no livro da lei de dia e de noite. Ora, o livro da lei, àquela altura, era tudo quanto havia das Escrituras Sagradas e, ao determinar que Josué, para que tivesse êxito em sua missão, não apartasse da sua boca a lei e nela meditasse de dia e de noite, o Senhor estava determinando que Josué não cessasse de refletir, pensar longamente, ocupar-se daquilo que estava escrito no livro.

A repetição do texto sagrado, a voz pequena, como um verdadeiro resmungo, com nítido objetivo de reflexão, de ponderação, com a finalidade de fazer com que a mente analise e aplique os preceitos constantes da Bíblia Sagrada no cotidiano de cada um é o sentido de “meditar” na maior parte das vezes em que as Escrituras falam em meditação, como podemos observar no Salmo 119, onde a palavra aparece diversas vezes (Sl.119:15,23,48,78,97,99,148), sempre relacionada com a leitura devocional da Palavra de Deus.

Esta meditação, conforme determinada por Deus a Josué, era uma meditação contínua. A expressão bíblica é “de dia e de noite”, ou seja, a qualquer hora do dia, a qualquer momento, em outras palavras, sempre. Assim como há um mandamento bíblico para orarmos ininterruptamente, também existe uma determinação do Senhor para que jamais deixemos de pensar e de refletir sobre as Escrituras Sagradas. O salmista diz que meditava todo o dia (Sl.119:97). Mas por que deveria Josué meditar de dia e de noite no livro da lei? O próprio Deus responde: “para que tenhas cuidado de fazer conforme a tudo quanto nele está escrito, porque então farás prosperar o teu caminho e então prudentemente te conduzirás” (Js.1:8). Estas palavras, a propósito, são repetidas pelo salmista (Sl.1).

A leitura devocional da Bíblia, por ser feita com apego, isto é, com meditação, com envolvimento mental e longa reflexão a respeito do que é lido, produz em cada leitor o cuidado necessário para que pratiquemos as ações corretas, para que ajamos segundo a vontade de Deus, que está expressa no texto sagrado, a fim de que tenhamos uma vida espiritual bem sucedida e que adquiramos a prudência, que é nada mais, nada menos que a ciência do Santo (Pv.9:10). Para que sejamos vitoriosos nas lutas diárias que temos na vida com Cristo nesta Terra, para que saibamos o que o Senhor Jesus, que é o Santo, quer de cada um de nós, é indispensável, são palavras do próprio Deus, que estejamos a meditar de dia e de noite na Palavra do Senhor.

Mas, além da palavra “hagah”, também é traduzido por “meditar” na Versão Almeida Revista e Corrigida, a palavra hebraica “shiyach”(שיח), cujo significado é “conversar consigo mesmo”, “refletir”, “ponderar”. Este termo é encontrado, v.g., no Sl.77:6, quando o salmista Asafe, num instante de angústia e aflição, ficou a arrazoar no seu coração o seu estado presente e o que Deus já havia feito em prol do Seu povo, pensando se Deus haveria de rejeitá-lo para sempre ou se tornaria a ser-lhe favorável. Mas, à luz da lembrança dos feitos do Senhor, o salmista viu que estava enfermo espiritualmente e afastou de si aquela sensação de incredulidade, de dúvida quanto à fidelidade do Senhor.

Notamos, pois, que, neste sentido, a “meditação” envolve não a lembrança literal do texto sagrado, mas é uma reflexão da mente a respeito das obras do Senhor, do caráter do Senhor, lembrança baseada, sem dúvida, na revelação divina nas Escrituras, mas que prescinde da leitura do texto bíblico ou de sua recitação a voz pequena. Foi o que fez o salmista no Salmo 104, quando, depois de observar a natureza e todas as obras do Senhor que a formam, diz que tudo quanto observou e analisou tinha sido “sua meditação a respeito do Senhor” (Sl.104:34).

Este significado de meditação, quase sempre presente na ideia de “meditação no coração”, também é apresentado pela palavra “hagah”, em textos como Sl.5:1, 63:6; 77:13; 19:14; 39:3 ; 49:13 e 143:5; Pv.15:28 e 24:2.

Notamos, portanto, que a meditação, no Antigo Testamento, não se apresenta apenas como uma reflexão mediante a recitação nas Escrituras, mas é também uma atividade de reflexão “no coração”, ou seja, uma reflexão baseada nas obras do Senhor, reflexão esta que, conquanto baseada na revelação escriturística, não depende do texto bíblico para se realizar.

OBS: “…Acerca do homem bem-aventurado do Salmo 1, é dito: ‘Antes tem o seu prazer na lei do Senhor, e na Sua lei medita de dia e de noite’ (A. G. Clarke diz: ‘A lei do Senhor aqui é praticamente sinônimo da Palavra do Senhor, toda a revelação divina’). Em primeiro lugar, ele se deleita na lei do Senhor, então ele medita nela. Meditação bíblica envolve o uso da mente no estudo da Palavra de Deus, ‘mastigando-a’ , assimilando- a, e então agindo com base no que tem sido aprendido.(…) Você meditará em Deus como você medita na Palavra. No Salmo 119, o salmista falou da Palavra em tudo, exceto em dois versos; ele se referiu à meditação sete vezes e se referiu a Deus em cada verso. Enquanto o salmista se deleitava na Palavra e meditava nela, pensamentos de Deus enchiam sua mente; assim será conosco.…” (NORRIS, John. A importância da meditação na vida do crente. Truth and tidigns, maio 1995, Trad. e adapt. por Claudinei Benedito Benedito. Disponível em: http://www.exame.diario.nom.br Acesso em 21 out. 2010).

Daí porque ter sido traduzida por “medita”, a palavra “shama’” (שמע), que significa “ouvir”, mas que, “in casu”, na fala de Elifaz, é um convite para que Jó refletisse sobre tudo quanto seu amigo lhe havia dito a respeito de Deus para, então, tomar uma atitude que o pudesse livrar daquela aflitiva situação em que se encontrava.

A meditação apresenta-se, pois, como uma concentração mental, mas não um mero exercício da razão, mas uma espécie de “balanço” no qual se volta para o interior e se verifica a sua situação diante de Deus e diante da situação em que se está. A “meditação” é uma atitude de interiorização, em que o salvo deverá refletir a respeito da revelação divina, buscará, num instante de silêncio e de falta de atividade, “escutar a voz do Senhor”, revelação esta que não se dá apenas nas Escrituras, mas também na natureza (Sl.19:1-3; Rm.1:20).

Comentários

  1. A Paz de Cristo, Derland. Fico grato pelo seu comentário. Continue nos visitando, um abraço.

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  2. Olá, obrigada pela visita no blog ETERNO, estou vendo que por aqui vou encontrar belos textos sempre.

    Um abraço

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  3. Néia, a Paz de Cristo.
    Edificar e ser edificado em Deus é nosso maior propósito aqui. Obrigado pelas palavras de incentivo. Um abraço.

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  4. Como diz o meu amigo e pastor lucinho barreto:
    -você está fazendo loucuras por cristo.
    Que Deus continue te abençoando...

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