De Estupros e Outros Crimes Faz-se a Globo
Por André Cintra
Aos 31 anos, o modelo
Daniel Echaniz alcançou a fama. Para chegar lá, não precisou de 15 minutos.
Bastaram-lhe sete. Poderia ter brilhado em tradicionais passarelas da moda ou
em milionários anúncios publicitários. Foi virar celebridade num dos programas
televisivos de maior audiência no Brasil – o “Big Brother Brasil 12”. O porém é que, para Daniel, a
fama veio pelo avesso. Pesa contra o modelo a acusação de ter estuprado a
estudante Monique Amin, de 23 anos, em meio a uma madrugada de bebedeiras, de
sábado para domingo passado, num dos ambientes do reality-show da TV Globo.
Daniel teria molestado uma desacordada Monique por 25 minutos, dos quais apenas
sete foram transmitidos ao vivo para assinantes do pay-per-view do “BBB”. Uma
gravação em vídeo já está em poder da Polícia Civil do Rio de Janeiro.
A cena do
suposto estupro foi vista por centenas de milhares de pessoas em sites de
compartilhamento de vídeos e repercutiu até na imprensa internacional. Alvo de
crescente execração pública nas redes sociais, Daniel foi eliminado do reality-
show nesta segunda-feira (17), “devido a um grave comportamento inadequado”,
conforme a nota oficial da Globo. A situação de Daniel Echaniz é complicada,
para dizer o mínimo. Seu destino está nas mãos de Monique — que, ao sair do
“BBB”, poderá se submeter a exame de corpo de delito e formalizar uma denúncia
contra o modelo. Aberto o inquérito, Daniel correrá o risco de ser preso, com
reclusão de oito a 15 anos. É uma reviravolta impensável para um sujeito que,
duas semanas atrás, mal desconfiava que seria um dos escolhidos para disputar o
prêmio de R$ 1,5 milhão do programa.
Recorrentes baixarias
Difícil é
prever se a Globo sairá incólume do caso. Não que, nos quase 47 anos de
história da emissora carioca, esse novo episódio pareça raio em céu azul.
Criada à margem da lei em 1965 — e consolidada à base de inúmeros escândalos,
alguns conhecidos, outros acobertados —, a Globo nunca considerou a ética uma
moeda de livre circulação em seu território. Muito pelo contrário. Historicamente,
o dia a dia na emissora sempre foi povoado, como diria o filósofo, por
artimanhas tais quais “o engano, o lisonjear, mentir e ludibriar, o
falar-por-trás-das-costas, o representar, o viver em glória do empréstimo, o
mascarar-se, a convenção dissimulante, o jogo teatral diante de outros e diante
de si mesmo”. Com o “BBB”, ano após ano, “essa arte do disfarce chega a seu
ápice”.
Que o
diga a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal. Uma única
edição do Big Brother — a décima, exibida de agosto de 2009 a abril de 2010 —
fez chegar à comissão nada menos que 227 denúncias de “desrespeito à dignidade
humana, apelo sexual, exposição de pessoas ao ridículo e nudez”. Na visão da
Globo, a perda de audiência e de credibilidade era compensada com faturamentos
recordes. A carta branca para a baixaria se incrementou na 11ª edição, no
primeiro trimestre de 2011. Antes mesmo de o programa começar, o diretor-geral
do reality show, J.B. Oliveira, o Boninho, já anunciava uma série de mudanças
para “esquentar” a atração. “Nada é proibido no BBB, pode fazer o que quiser. Esse
ano... liberado! vai valer tudo, até porrada”, escreveu ele no “Twitter”,
prometendo ainda álcool à vontade: “Vai ser power... chega de bebida de
criança. Acabou o ICE no BBB, esse ano TUDO vai ser diferente”.
“Circo de débeis mentais”
Não é
nenhum exagero apontar que o episódio do estupro decorre dessa inacreditável
escalada de permissividade. “Para ser bem franco, eu achava que iria haver um
assassinato no ‘BBB’, antes de acontecer um estupro. Desde muito tempo que o
critério de seleção para o programa tem sido a demência intelectual, o
comportamento antissocial, o perfil violento e a falta de caráter, tudo isso
potencializado em festas regadas a enormes quantidades de álcool”, sintetizou o
jornalista-blogueiro Leandro Fortes.
“Que
tenha aparecido um idiota para estuprar uma mulher quase em coma alcoólico não
chega a ser exatamente uma surpresa, portanto”, emenda. Suas críticas se
dirigem especialmente ao jornalista Pedro Bial, chamado por Leandro de
“mestre-de-cerimônias desse circo de débeis mentais montado pela TV Globo”.
Qualquer
mestre-de-cerimônias, como se sabe, tem limitada autonomia para fugir do
script. Pode-se topar o (digamos assim) “desafio profissional” por inúmeras
razões — mas não consta que Pedro Bial demonstre algum tipo de repúdio às aberrações
do “BBB”. No caso do suposto “estupro”, o comportamento de Bial seguiu à risca
a máxima da americana Janet Malcolm: “Qualquer jornalista que não seja
demasiado obtuso ou cheio de si para perceber o que está acontecendo sabe que o
que ele faz é moralmente indefensável”.
Na noite
de domingo, em sua primeira aparição depois da polêmica — e da repercussão do
caso nas redes sociais —, o apresentador do BBB se limitou a reduzir tudo a um
chavão: “O amor é lindo”. Horas antes, a pedido do departamento jurídico da
Globo, o vídeo do suposto estupro foi apagado na página do “BBB” na internet e
em sites como o “YouTube”. Boninho chegou a dizer que “não rolou” crime e que
“eles (Daniel e Monique) supostamente transaram”. Artistas globais que
criticaram Daniel ou o programa foram igualmente censurados.
Os "limites"
Já se
sabe, a esta hora, que a “operação abafa” da Globo fracassou rotundamente.
Graças ao corajoso delegado Antonio Ricardo, uma diligência policial foi ao
estúdio do Projac, no Rio, para ouvir Daniel e Monique, por “suspeita de abuso
sexual”. A Secretaria de Políticas para Mulheres da Presidência da República,
pediu que o Ministério Público do Rio de Janeiro tomasse “providências
cabíveis” na apuração do caso, em consideração às “demandas encaminhadas por
cidadãs de várias cidades brasileiras”. O fato é que a expulsão de Daniel do
“BBB” ocorreu apenas quando a Globo se viu prestes a ser indiciada por “crime
de omissão” — o que poderia tirar o programa do ar. Depois de abrir as portas
do Projac para a polícia e cortar até o áudio do reality-show, a emissora se
deu conta de que uma crise de credibilidade também estava em curso.
Só então
Bial esqueceu que “o amor é lindo” e falou em “violação do regulamento”,
enquanto Boninho finalmente admitiu que Daniel “passou dos limites do
relacionamento com as pessoas” e que “o comportamento dele foi excessivo”. Para
todos os efeitos, o crime e a e Globo estão, mais uma vez, de mãos dadas. Na
zona das sombras, a emissora da família Marinho prometeu colaborar “ao máximo”
com a investigação e arcar com os custos judiciais do agora ex-BBB Daniel.
Falta combinar quem prestará assistência à suposta vítima, Monique Amin, a quem
a Globo não teve nem sequer a dignidade de mostrar a íntegra das polêmicas
imagens. E falta, sobretudo, reconhecer que violar regras, ultrapassar limites
e cometer excessos são práticas consagradas, há pelo menos 47 anos, pela
própria Globo.
Fonte:
http://grabois.org.br/portal/noticia.php?id_sessao=8&id_noticia=7863
Que estrupo? se a mesma ja disse que foi um ato consentido por ela ? e ficarmos esticando um assunto que não existe.
ResponderExcluirA Paz de Cristo, Pr. Welington. Bom ver sua participação em nosso blog! Esclarecendo: Quando o autor fala de estupros não se refere, necessariamente, ao ocorrido no reality show, mas de violências cometidas pela emissora no decorrer da história do nosso país; veja que ele - o autor - usa o termo "estupros", no plural, indicando atos vários, e não um ato determinado. O autor está usando um episódio como uma metáfora para falar de vários desrespeitos cometidos. Abraço.
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